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STF decide pela cobrança de ISS sobre softwares

Em sessão na próxima semana, ministros vão decidir a partir de quando vale entendimento

O Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou ontem um importante julgamento tributário, que só dependia do voto do ministro Nunes Marques. Por maioria, alterou a jurisprudência de mais de duas décadas e decidiu que incide ISS sobre softwares. O entendimento vale tanto para o produto “de prateleira”, comercializado no varejo, quanto para o fornecido sob encomenda.

Até então, a interpretação era a de que sobre o software de prateleira deveria incidir o ICMS. Sobre o feito sob encomenda, ISS. Agora, as atenções do setor se voltam à possibilidade de os ministros decidirem a partir de quando vale o entendimento (modularem os efeitos da decisão). Se definirem que não vale para o passado, impedem os contribuintes de recuperar o que pagaram indevidamente.

Dos onze integrantes do STF, sete votaram pela incidência do ISS para ambos os produtos. A jurisprudência que existia até então havia sido firmada em julgamento de 1998. O novo entendimento atende o pleito das empresas de tecnologia. Para elas pode ser bem mais vantajoso pagar ISS do que ICMS. Na capital paulista, por exemplo, são cobrados 2% de ISS, enquanto que o ICMS tem alíquota de 5% no Estado.

O tema foi julgado no STF por meio de duas ações diretas de inconstitucionalidade. Uma delas, a ADI 1945, foi proposta em 1999, quando a transferência eletrônica do software ainda era feita por disquete. Hoje, a comercialização ocorre por meio de download ou streaming. A ADI 5659 é mais recente e abrange os meios atuais para a comercialização de software.

Os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Luiz Fux haviam votado pelo ISS. Para o relator, ministro Dias Toffoli, a questão não se trata de vetar o imposto estadual por não haver a transferência de um bem material. Ele entende que seria possível caracterizar como circulação de mercadoria – o fato gerador do ICMS – mesmo no caso de “bem incorpóreo”.

Segundo Toffoli, no caso de licenciamento e cessão de direito de uso dos programas de computador se está tratando de serviços e, por esse motivo, deve incidir ISS e não ICMS. Ele levou em conta a Lei Complementar nº 116, de 2003, que prevê essas hipóteses como fato gerador do imposto municipal.

Os ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Nunes Marques divergiram. Para eles, a situação do software de prateleira é diferente da situação do software personalizado. Ao de prateleira, comercializado em larga escala, de acordo com eles, deveria incidir o imposto estadual.

Ao se manifestar sobre o tema, o ministro Gilmar Mendes fez um alerta: “Caminhamos para um modelo de serviço de forma generalizada com a informatização. É muito provável que nós possamos prognosticar que o ICMS, como nós conhecemos, tende a desaparecer. Essa notícia é muito preocupante para os Estados, esse é o tributo que carrega a estrutura federativa no que diz respeito aos Estados.”

O julgamento estava parado desde novembro e foi retomado ontem com o voto-vista do ministro Nunes Marques. O ministro citou a jurisprudência do STF e o princípio da legalidade tributária.

Para ele, mera cessão digital sem suporte físico não faz incidir o ISS. O ministro não reconhece no software padronizado o elemento necessário para incidência do ISS. Para isso, considera que seria necessária uma personalização na contratação.

A transmissão do software é um típico ato de comércio, o que implica em circulação, segundo Nunes Marques. “Para fins de incidência de ISS no que toca à operação envolvendo software haveria a necessidade que o fazer humano em questão fosse voltado a uma personalização enquanto núcleo da contratação entre prestador e comprador”, afirmou.

Ficou pendente a modulação. Inicialmente, o relator, ministro Dias Toffoli, havia proposto a eficácia dessa decisão a partir da data da publicação da ata de julgamento. Na sessão de ontem, fez um ajuste, acrescentando que considera válidos os recolhimentos de ISS ou ICMS já realizados em relação a operações com softwares.

A proposta vedaria aos municípios cobrar ISS de quem pagou ICMS e também impediria o pedido de ressarcimento do contribuinte que pagou ICMS nos últimos cinco anos. “Aquilo que já foi pago até a publicação da ata está efetivamente realizado”, disse.

O que foi proposto gerou polêmica. Para o ministro Alexandre de Moraes, essa modulação poderia prejudicar o contribuinte adimplente. “Aquele que pagou tudo certinho não pode pedir de volta, mas aquele que não pagou ou entrou na Justiça, como ficaria?”, questionou.

Com as discussões, o presidente do STF, ministro Luiz Fux, sugeriu deixar para analisar todas as situações englobadas na modulação em sessão na próxima semana.

“O julgamento da próxima semana é muito importante. Ele sinalizará como a modulação é perigosa”, afirma a advogada Valdirene Lopes Franhani, sócia do Lopes Franhani. “Se é inconstitucional não tem que devolver para o contribuinte?” A advogada lembra da situação das empresas que, por causa de liminares, não pagaram nem ISS nem ICMS nos últimos anos.

Rodolfo Fücher, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), entende que a modulação pode ser resolvida de forma simples. “Se pagou ISS no passado está pago e se pagou ICMS também. Para aqueles que não pagaram, em razão de ação judicial, decide-se pelo ISS, como está afirmando, agora, o Supremo”, diz.

Para Fücher, no entanto, o principal – a definição do caso – está resolvido. “É muito importante. Sempre interpretamos pelo ISS, eu diria que 98% das empresas pagam ISS, mas havia o risco. E essa indefinição inibia muitos investimentos”, afirma.

Italo Nogueira, presidente da Federação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro), complementa que as médias e grandes empresas enfrentavam problemas, por causa da tributação, nas operações de fusão e aquisição. “Estávamos tendo problemas na precificação. Qualquer comprador, qualquer fundo de investimento, enxergava isso como um passivo e um passivo muito perigoso. Agora, com a decisão do STF, estamos felizes.”

Fonte: Valor – Beatriz Olivon e Joice Bacelo — De Brasília e do Rio